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quarta-feira, 11 de julho de 2012

A Bela...



Hoje é 11 de Julho, ..., de 2012, pelo Calendário Juliano... Exatos 19 anos nos separam do dia 11 de Julho de 1993... Apenas 17 minutos haviam transcorrido desde a meia-noite, enquanto a madrugada avançava sobre o dia 11 de Julho de 1993... Um jovem adulto curtia um som, deitado no tapete da sala de sua humilde residência, um apartamento de dois quartos no bairro da Ponte Preta em Campinas; e sonhando acordado com o nascimento de sua primeira filha... A trilha sonora era 'Shine on you, crazy diamond', e ele sonhava que ela brilharia, de um jeito ou de outro... E este brilho estaria refletido dentro dele, de um jeito ou de outro...

Este pai sonhava acordado, e seguia absorto a dinâmica do Pink Floyd na longa balada Blues-Psicodélica, em seu head-phone... Quando, entre uma nota e outra da guitarra de Gilmour, pôde definir com clareza quando um som bem real e terreno anunciou o esperado - embora inesperado - evento: Isabela havia antecipado sua estréia... 'Carlos, estourou a bolsa'... E isso na madrugada de Sábado para Domingo, e exatamente um dia antes da data marcada para a estréia, já que a cesariana estava marcada para a Segunda - e isso porque a nossa Isa havia chegado sentadinha... 


Tendo considerado as coincidências, apenas por um lapso, corri para atender à emocionada e preocupada mamãe... Mantive a calma, externamente, e tratei de lembrar do 'procedimento'... Sim, ligar para a médica e avisar que estávamos indo para a maternidade, onde tudo já estava preparado - para a segunda -, ligar para a família da mãe - já que a minha família estava a mil quilômetros dali -, e arrumar a bolsa - não a que havia estourado... Tratei de acalmar a mamãe, acomodando-a em uma posição confortável para ambas, enquanto tratava da 'outra bolsa', aquele que foi curtida, buscada, rosa, com um coelhinho desenhado... A bolsa com as coisinhas da Isa... O babador que comprei no dia em que recebi a notícia da gravidez estava lá dentro, mesmo sabendo que ela não poderia utilizá-lo... Mas as roupinhas, as coisinhas, já estavam separadas, embora não acomodadas... Fui rápido e certeiro, mas contando com a supervisão de uma mamãe bastante ordeira e precavida... Na verdade estava tudo no jeito...

Descemos para o carro, e 'Shine on you, crazy diamond' não saia da minha cabeça... 'Que coincidência', pensei... No trajeto para a maternidade a mamãe estava um pouco tensa, mas eu fazia piadinhas, e comecei a cantarolar 'Rebento' de Gilberto Gil... E 'Rebento' assumiu o lugar de 'Shine on...', como o mantra em minha cabeça... 

Chegamos ao hospital e tratei de ser quem eu era, rsrsrs, e sou... Tratei de empenhar toda a minha atenção e meios para garantir a segurança e conforto 'delas'... O mundo está preparado para o 'não', arrancar um sim é sempre trabalhoso, e a ocasião era apropriada para invocar o trocadilho: afinal 'quem não chora' - definitivamente - 'não mama'... Tudo parecia encaminhado, mãe e filha atendidas... Mas segui sendo quem eu era, quem eu sou, e neste caso um homem capaz de indignar-se com injustiças... Um homem capaz de se levantar e lutar por uma boa causa... E isso porque enquanto minha mulher era atendida confortável e particularmente em um consultório, outra mãe, com sangramento, estava sendo 'expulsa' da maternidade... Não pude aceitar calado, enquanto sua família contrariada mas resignada, tratava de juntar os trapos para partir... Tratei de intervir, discursei com autoridade, jargões advocatícios, legais, ou sei lá o quê, e com crescente autoridade despejei sincera indignação... Tratei, eu, o jovem pai sonhador, de ameaçar a todos naquele hospital, caso qualquer coisa viesse a acontecer à mamãe e à criança... Eu testemunhava tudo, e faria de tudo para lutar por justiça... E cheguei a oferecer-me para dar um cheque caução, e felizmente não prestaram muita atenção a isso, rsrsrsrs... A mãe e seu bebê também foram atendidos...

Passei a concentrar-me novamente na minha Isa, Isabela, nome que equivale a 'duplamente bela', ou bela duas vezes... Tratei de preparar a filmadora... Naquele tempo, há 19 anos, não era tão frequente que pais assistissem a partos... E bem que tentei, mas a Maternidade não permitiu... Paciência... Fiquei ali sentado nos degraus de uma escada, bem ao lado da sala de parto... Eu havia avisado também à família da mamãe, que veio em peso, o vovô, o finado 'Ozonor', a vovó Doli, e as tias Fê e Rô... Enquanto o seu Ozonor tremia de medo e apreensão, mas também por não dispor de suficiente nicotina, as mulheres tratavam de puxar um 'pai nosso', seguido de várias 'ave Maria'... Busquei então um refugiu para cuidar de minha própria apreensão, como 'descrente novo'... De forma que experimentava pela primeira vez a mais completa ausência da barganha 'me ajuda que eu te glorifico'... Já era... Precisava ser honesto comigo mesmo, e coerente... Bom, desejei apenas que tudo saísse bem, afinal havíamos trabalhado para isso... A Renata - também descrente - havia cuidado com esmero e disciplina de sua saúde, e da saúde de sua bebê... Havia passado uma gravidez tranquila e regrada... Fizemos o acompanhamento médico com requintes de dedicação e qualidade... Trabalhamos antes para colher os frutos de uma gestação e um parto tranquilos... E assim foi, apesar da Isa 'preferir' permanecer sentadinha...

Até que a porta do Centro Cirúrgico se abriu, e lá estava ela... Minha filhinha, minha Isa, Isabela... A câmera pendeu no vazio e não caiu por força de uma alça de segurança... As imagens desta preciosidade 'brilhando' pela primeira vez ficaram e ficarão apenas em nossas memórias... A câmera fitava o chão, enquanto pendulava, deixando para a posteridade apenas o registro de nossas exclamações: 'que linda, que linda, minha filhinha'... 

O hospital logo percebeu que um pai bobo e exagerado estava à solta, enchendo o quarto de flores e bichinhos de pelúcia... A Isa passou bem, sem problemas, e a sua mamãe também... Os parentes e amigos passaram em revista, rsrsrsrs, e puderam testemunhar autêntica felicidade... E conforme planejado deixamos o hospital levando a nossa bebê pra casa, abarrotados de flores e mimos em geral...

A casa estava preparada para ela, as roupas de cama, edredons e afins estavam estampados com ursinhos, assim como o berço e a cômoda que eu havia desenhado para o marceneiro fabricar... Os seus móveis eram em mogno, e se apertavam no apartamento diminuto, mas por pouco tempo... Logo nos mudamos para o Cambuí, e para um apartamento bem maior, onde a Isa passou a sua infância... Filmei e fotografei tudo o que pude... Cada gesto, cada atitude curiosa ou não, tudo... Até que um dia, enquanto seguia a minha pequena com a câmera, ela me disse: 'papai, me deixa quietinha um pouquinho', rsrsrsrsrsrs.... Curti tanto a minha filhota, e contei estorinhas para que dormisse todos os dias de sua infância... 'E de repente, um vulto, quem era?', ao que ela respondia: 'a féia'... Sim a féia... 

Minha filha veio com um desafio... Eu queria ser um homem melhor, um pai melhor, um humano melhor... Hoje é o seu aniversário, mas sou eu quem celebro este presente: 'minha filha'... 'A Bela', que passou a representar um norte em minha vida... Passei a viver por ela, e para deixar um legado de exemplo e de amor por ela... E tem sido assim...

Minha filha querida, o aniversário é seu, mas o presente é meu... 'Você é algo assim, é tudo pra mim, é mais do que eu sonhava'... Agora uma mulher... Estudando para ser advogada, e ajudar a quem precise de justiça... Conte sempre comigo filha... Te amo...

Carlos Sherman

2 comentários:

  1. Lindo texto!!!
    Terça-feira fui com Denise ao médico e escutei o coraçãozinho do bebê batendo pela primeira vez através do ultrassom...Foi a música mais bela que eu já ouvi na vida!

    Abraço,
    Theo Luiz

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  2. Que lindo, amigo!!! Ser pai - e mãe - de verdade, e ter o coração batendo fora do corpo... E tens toda a razão, esta é a 'música da vida', e será de agora em diante a trilha sonora da sua vida... Sei que será 'o pai'... Desfrute... Beijos na mamãe...

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